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Marcelo John

Reforma tributária: O que muda?

“Nada é mais certo neste mundo do que a morte e os impostos”. Essa célebre frase de Benjamin Franklin nos leva a refletir sobre a importância da tributação na sociedade moderna. Os tributos estão presentes em tudo ao nosso redor. Impactam nossas propriedades, nossa renda, aquilo que consumimos. Tudo. Mas, apesar de ser um tema extremamente relevante, no Brasil, infelizmente, é um tema do qual poucos compreendem.


Por esse motivo é que acredito que o maior presente da reforma tributária foi trazer a público essa discussão. A necessidade de que as pessoas saibam quanto pagam de tributos, como a tributação reflete na nossa economia e quais os possíveis efeitos em determinados setores econômicos são todas questões que finalmente estão em pauta com destaque na grande mídia.


Se a reforma tributária conseguirá cumprir com suas promessas e quais são os seus pontos positivos e negativos é uma questão que será abordada em outra oportunidade. Hoje, tratarei sobre o que mudará com a reforma tributária.


As principais mudanças são as seguintes:

  • Simplificação do sistema: É a principal proposta desta reforma tributária. Atualmente, existem cinco tributos incidentes sobre o consumo: IPI, PIS, COFINS, ICMS e ISS. Todos esses tributos serão transformados em um IVA (imposto sobre valor agregado) que se divide em dois: CBS (contribuição sobre bens e serviços) e IBS (imposto sobre bens e serviços). Na prática, pelo modelo proposto, CBS e IBS são o mesmo tributo, com a única diferença de que o primeiro é de competência da União enquanto o segundo é de competência dos Estados e Municípios.

  • Não-cumulatividade plena: O IVA será incidente sobre bens, materiais ou imateriais, serviços e direitos. A ideia é que a tributação seja ampla, de forma que, a partir de sua instituição, todo o consumo realizado no Brasil será tributado. Contudo, essa tributação será não cumulativa, isto é, de forma que não ocorra a incidência do IVA em cascata. Logo, as empresas inseridas na cadeia de produção poderão fazer o abate entre o que devem de IVA e o que já pagaram pelo consumo de produtos e serviços adquiridos na etapa anterior.

  • Alíquota: Haverá uma alíquota padrão para todos os bens e serviços, mas alguns bens e serviços específicos serão beneficiados com uma redução de 60% ou 100% da alíquota (o valor da alíquota será definido somente em etapa posterior, quando o tributo for instituído por meio de lei complementar. Estima-se que a alíquota girará em torno de 25%). Entre os bens e serviços favorecidos, cita-se como exemplo os serviços de educação e saúde, produtos agropecuários e de higiene pessoal, medicamentos, transporte coletivo, produções artísticas e culturais, entre outros.

  • Regimes fiscais específicos: Além disso, alguns produtos e serviços terão regimes específicos, com regras especiais. A ideia é que determinados setores, em razão da sua especificidade, necessitam de tratamento diferenciado. Cita-se como exemplos de serviços e produtos que possuirão regimes específicos os serviços financeiros, de hotelaria, parques de diversão e temáticos, restaurantes, aviação regional, planos de saúde, operações com bens imóveis, concursos de prognósticos (loterias), entre outros.

  • Tributação no destino e por fora: Ao contrário do que é feito no sistema atual, o tributo passará a ser devido no local onde foi consumido e não incidirá sobre si mesmo.

  • Sistema de cashback: Será instituído um sistema de cashback que tem como objetivo reduzir as desigualdades de renda no nosso país. Com ele, parte do dinheiro arrecadado será revertido à população de baixa renda.

  • Período de transição: As mudanças começarão a valer a partir de 2026, num esquema de substituição gradual dos tributos atualmente cobrados. A transição se finaliza no ano de 2032, de forma que a partir de 2033 o novo sistema terá vigência plena.

  • Conselho Federativo para gestão do IBS: Como mencionado, o IBS será um imposto de competência dos Estados e Municípios. A proposta prevê uma gestão compartilhada entre os referidos entes através de um Conselho Federativo, que poderá editar normas infralegais sobre o imposto; arrecadar, efetuar as compensações e distribuir o produto da arrecadação; uniformizar a interpretação e aplicação da legislação atinente ao tributo; e resolver eventuais conflitos instaurados na instância administrativa entre os contribuintes e a Administração Pública.

  • Imposto Seletivo: Além do IVA, haverá também o Imposto Seletivo, que será incidente sobre bens nocivos à saúde e ao meio ambiente. Ou seja, o imposto seletivo possui uma função extrafiscal, permitindo ao Estado desestimular o consumo de bens que sejam entendidos como prejudiciais à sociedade e ao meio ambiente de forma geral.

  • Instituição de Fundos: Pretende-se a instituição de um Fundo para fomentar o desenvolvimento das diferentes regiões do Brasil, reduzindo desigualdades regionais (Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional) e de Fundos de Combate à Pobreza ligados aos Estados, DF e Municípios.

  • IPVA: O IPVA passará a ser progressivo (quanto maior o valor do bem, maior a alíquota) e incidirá também sobre aeronaves e embarcações.

  • ITCMD: O ITCMD é o imposto incidente sobre a herança e doação. Ele passará a ser progressivo em função do valor da transmissão.

  • IPTU: O Poder Executivo (representado, no âmbito municipal, pelo prefeito) poderá atualizar a base de cálculo do IPTU através de decreto. Atualmente, as prefeituras podem somente fixar critérios de correção monetária do valor venal do imóvel através dessa via.

  • Nova Contribuição dos Estados e DF: Esse é o grande “jabuti” da reforma tributária. Inserida no texto ao apagar das luzes, a contribuição de competência dos Estados e do DF poderá vigorar até o ano de 2043 e incidirá sobre produtos primários e semielaborados produzidos nos territórios dos entes, sendo destinada ao investimento em obras de infraestruturas e habitação.


De forma geral, essas são as principais alterações propostas pela reforma tributária. Elas incitaram – e vêm incitando – muitos debates, com um lado defendendo que ela é necessária e imprescindível para o crescimento do Brasil e outro argumentando que estamos diante de um presente de grego.


Iniciei esse texto chamando atenção para o fato de que uma das grandes vitórias da reforma tributária foi publicizar uma discussão que é essencial para o progresso do país como um todo. Uma reforma para o nosso sistema é necessária, não há dúvidas quanto a isso. Contudo, nem sempre o mérito da questão está naquilo que deve ser feito, mas sim em como aquilo deve ser feito.


A reforma tributária tem aspectos positivos e aspectos que merecem sim serem criticados. É importante destacar que, muito mais que assumir um lado, o essencial é que haja cooperação entre críticos e defensores para que o texto – que ainda pode ser alterado pelo Senado – chegue a uma versão final que, no mínimo, promova alguma melhora em relação ao nosso cenário atual.


Faço essa ressalva para destacar que um assunto tão essencial não pode nem deve ser tratado da maneira como o foi: aprovado às pressas, com diversas alterações de última hora e sem qualquer tempo hábil para a realização de ponderações construtivas acerca do texto da proposta.


Qual o impacto da oneração do setor de serviços no nosso país? Como isso poderia ser amenizado? Como desenvolver um Conselho Federativo que não afete de maneira prejudicial a autonomia dos entes tributantes? Por que criar uma contribuição que vai à contramão de todos os ideais visados pela reforma? Todos os setores que receberão tratamento diferenciado ou favorecido necessitavam, de fato, dessa condição? São todas questões que poderiam ser melhores debatidas se a situação houvesse sido conduzida com um mínimo de respeito por parte de nossos parlamentares.


Gostemos ou não, a reforma segue adiante e viva. Cabe a nós, agora, atuarmos de maneira cooperativa para não desperdiçarmos uma grande oportunidade de melhoria no nosso país.

 
Dr. Marcelo John, advogado tributarista, Goiás

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