Estudo revela que apostas esportivas afetam orçamentos familiares, especialmente entre os brasileiros de menor renda
O crescimento das apostas esportivas online no Brasil, as chamadas "bets", está começando a impactar negativamente o consumo de bens e serviços, especialmente entre as classes sociais de menor poder aquisitivo. Essa tendência pode prejudicar a percepção de melhoria na economia brasileira, afetando a renda, o emprego e o controle da inflação, de acordo com a consultoria PwC Strategy& do Brasil, ligada à multinacional PricewaterhouseCoopers.
Impacto econômico e social
Gerson Charchat, economista e sócio da PwC Strategy&, alerta que os gastos com apostas esportivas já superam despesas tradicionais, como lazer, cultura e até alimentação, colocando em risco o orçamento familiar. "Esse desvio de recursos para as apostas exerce uma pressão significativa sobre a demanda por produtos essenciais, afetando a economia de forma geral", explica Charchat.
Desde a regulamentação das apostas esportivas em 2018, houve um crescimento de 419% nos gastos com essas atividades. As apostas, que representavam apenas 0,27% do orçamento das famílias das classes D e E em 2018, agora consomem 1,98% desse orçamento. Isso representa um aumento de quase quatro vezes em apenas cinco anos. Enquanto isso, os gastos com lazer e cultura diminuíram, e os com alimentação permaneceram estáveis.
Ameaça ao consumo e endividamento
O aumento das apostas esportivas online é especialmente preocupante entre os jovens de classes sociais mais baixas, que acabam comprometendo uma parte significativa de sua renda com essa atividade. Isso pode resultar em endividamento crescente e, consequentemente, ter impactos negativos no crescimento econômico do país.
Uma pesquisa realizada pela Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo (SBVC) em maio deste ano reforça essa preocupação. O levantamento mostra que 64% dos apostadores utilizam parte de sua renda principal para jogar, e 63% relataram ter comprometido sua renda devido às apostas online. Além disso, 23% deixaram de comprar roupas, 19% reduziram a compra de itens de mercado, 14% cortaram gastos com produtos de higiene e beleza, e 11% diminuíram despesas com saúde e medicamentos.
Desafios para a regulamentação e saúde pública
A economista Ione Amorim, do Instituto de Defesa do Consumidor (Idec), destaca que o crescimento descontrolado das apostas esportivas não apenas afeta a economia, mas também traz sérios problemas sociais e de saúde mental. Ela alerta para o aumento de casos de endividamento extremo, destruição de lares e até suicídios associados à dependência do jogo. "O público de menor poder aquisitivo é especialmente vulnerável, pois muitas vezes busca nas apostas uma solução para problemas financeiros, sem entender os riscos envolvidos", afirma Ione.
Possíveis consequências futuras
O cenário pode se agravar ainda mais com a possível aprovação do Projeto de Lei nº 2.234/2022, que permitiria a exploração de cassinos, bingos, jogo do bicho e apostas em corridas de cavalo em todo o Brasil. Embora a legalização seja defendida pela perspectiva de geração de empregos e arrecadação de tributos, os riscos sociais e econômicos são evidentes. A arrecadação de impostos pelo setor ainda não começou, e o impacto total das apostas esportivas na economia brasileira só será conhecido quando as plataformas obtiverem a autorização do Ministério da Fazenda para operação comercial.