No cenário mundial de cirurgias plásticas, o Brasil ocupa o topo do ranking, com mais de 1,3 milhões de intervenções realizadas anualmente, segundo a Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica (ISAPS). Dentre as diversas opções de procedimentos que garantem uma melhora na autoestima, saúde e qualidade de vida das mulheres estão as cirurgias íntimas, que têm ganhado destaque nos últimos anos.
A crescente procura por esse tipo de procedimento sinaliza uma mudança nas percepções culturais e individuais sobre o corpo feminino, revolucionando o papel da sexualidade e sua independência na vida das mulheres. Desde os movimentos feministas dos anos 1970, em que as mulheres passaram a reivindicar seu espaço, não apenas na esfera pública, mas também no âmbito individual, até os dias atuais, observamos uma (r)evolução na forma como elas enxergam e sentem o prazer sexual, além da construção da autoestima e qualidade de vida atrelado a ele.
Nos últimos anos, estes procedimentos passaram a ser percebidos por uma ótica que vai muito além da estética, avançando rumo ao empoderamento, liberdade de escolha, e a inédita priorização da sua individualidade, desejos e, sobretudo, seu próprio corpo.
Entre os diferentes tipos de cirurgias íntimas, destacam-se a redução dos pequenos lábios (conhecida como ninfoplastia), aumento dos grandes lábios com enxerto de gordura, redução do prepúcio clitoriano (pele que recobre o clitóris), lipoaspiração na região pubiana e lifting pubiano. Somente em 2020, a ninfoplastia foi realizada por 20.334 mulheres no Brasil, conforme aponta a ISAPS e, desde 2013, o país mantém sua posição de destaque nesse cenário, com um crescimento significativo no número de procedimentos íntimos ao longo dos anos.
Benefícios além da estética
Embora a dimensão estética seja predominante nas pacientes que procuram por estes procedimentos, algumas técnicas também podem solucionar fatores funcionais, como dificuldades na higiene e desconfortos durante as relações sexuais, além de um impacto positivo na autoimagem, autoestima e sexualidade da maioria das mulheres submetidas à estas cirurgias, conforme avaliamos em estudos e no próprio consultório.
No caso do lifting pubiano, o estudo “Os efeitos da abdominoplastia na sexualidade feminina”, produzido por mim e outros profissionais da área, e publicado no The Journal of Sexual Medicine, aponta que, quando o lifting pubiano é realizado conjuntamente com a cirurgia plástica de abdômen, há melhorias significativas no estímulo clitoriano durante a relação sexual, uma vez que o clítoris é reposicionado 2 cm superiormente em relação ao seu local original devido à tração. Esta nova posição expõe o clitóris ao atrito durante a relação sexual - o que destaca mais um benefício do procedimento.
Como toda cirurgia, o profissional que indica alguma das citadas acima deve ponderar a idade e a condição da paciente. Em geral, as operações são feitas em pacientes adultas em diferentes fases de vida, desde a infância, caso haja uma indicação clínica e, principalmente, após os 40 anos ou gestações, uma vez que a perda de volume dos pequenos lábios ocorre geralmente neste período. Já o acúmulo de gordura na região pubiana pode ocorrer com alterações de peso ou após a menopausa. Portanto, as cirurgias íntimas femininas podem ser realizadas ao longo de toda a vida.
O período pós-operatório destas cirurgias plásticas exige que o paciente siga todas as instruções indicadas pelo profissional e contribui para o sucesso dos resultados esperados pela paciente. No geral, as pacientes podem retomar suas atividades cotidianas dentro de um intervalo de 1 a 2 semanas, variando de acordo com o tipo específico de cirurgia realizada. A liberação para a retomada da atividade sexual é estabelecida após aproximadamente 30 dias, assim como à prática esportiva. Entretanto, esportes que envolvem ciclismo e hipismo podem demandar um tempo adicional antes de serem completamente liberados. Essa precaução garante a segurança e o conforto das pacientes, permitindo uma recuperação gradual e adequada antes do retorno a atividades que possam exercer pressão ou atrito na região operada.
E o SUS?
Ainda que a idade da paciente não seja determinante para a realização da cirurgia, restrições legais relacionadas à cobertura de procedimentos estéticos pelo sistema público e planos de saúde podem restringi-las a um grupo específico da população.
A Lei nº 9.656/98 estabelece que as seguradoras não são obrigadas a cobrir procedimentos clínicos ou cirúrgicos para fins estéticos. Já no Sistema Único de Saúde (SUS), é preciso que haja uma avaliação profissional que comprove que o procedimento tem justificativa clínica, e não apenas estética. Hoje, apenas duas cirurgias íntimas são cobertas pelo SUS: a ninfoplastia (esta feita pelo cirurgião plástico) e a perineoplastia, para diminuição da flacidez na região, feita pelo ginecologista.
Assim, observamos que as cirurgias plásticas íntimas no Brasil não são apenas uma tendência, mas uma realidade consolidada. O país lidera em número e variedade de procedimentos, destacando-se não apenas pela busca da estética, mas também pela atenção e cuidado ao bem-estar das mulheres. Contudo, é crucial abordar essas intervenções com cautela, principalmente em espaços como a internet e as redes sociais, as quais devem ser decididas também com base nos impactos na saúde mental, autoestima e qualidade de vida das mulheres que optam por esses procedimentos.
Dr. Fabio Nahas é Cirurgião Plástico, Professor da Unifesp e Diretor Científico Internacional da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica